A Literatura não tem qualquer utilidade.
Porque insistem em ler?
1-A leitura é quase uma experiência religiosa. Abrimos o livro e ficamos quase imóveis, entregues ao silêncio, perscrutando a nossa consciência. Há uma voz que nos aborda, uma entidade que nos conta algo que aconteceu. E o leitor entrega-se, com maior ou menor interesse, a essa entidade. Tem um desejo, somente: Anseia que o narrador o faça acreditar no que está a acontecer.
2-No que é que a Literatura é útil? Em nada. Procurar uma função na Literatura é um erro do leitor e não da Literatura, em si. O texto literário não quer mais do que aquilo que tem, não reclama uma função, nem tem intenção de melhorar seja quem for. Ler não serve para se ser uma pessoa melhor, uma pessoa bondosa. Stalin e Hitler eram leitores vorazes. Tinham bibliotecas recheadas de livros. Einstein criou os fundamentos que levaram à Bomba Atómica. Eles leram muito.
3-Nós sabemos de cor muitas coisas. Sabemos de cor muitos episódios da nossa História. Guardamos na memória os momentos de coragem do nosso povo. Está nos livros, fica nos livros, não aprendemos nada com a informação que retemos. Nada.
4- “Cor”- significa, em Latim, Coração. Por extensão de sentido, saber-de-cor, é algo que sabemos e sentimos, algo que vem do coração e sai sem esforço. Em inglês, por exemplo, diz-se “To know by heart” – saber pelo coração.
Coragem- do Latim “Coraticum”, derivado de “Cor”…que significa coração. Poderá ter vindo, também, da palavra francesa “Coeur”.É no coração que, em muitas culturas, habitam a inteligência, a sabedoria, o ânimo, a rectidão. “Ele/Ela tem bom coração”, dizemos muitas vezes. Um dos sinónimos é constância.
5- Novamente: Afinal…porque é que lemos? Não sei. Mas posso, se me permitem, aconselhar a procura de outras características na Literatura. Se há algo que a Literatura pode fazer por nós, então é ensinar-nos a fazer perguntas. Quando começarmos, como povo, a fazer perguntas diferentes podemos aceder a respostas diferentes. Procurai perguntas. Provavelmente, começarão a interrogar-se sobre a qualidade de quem nos pede para ter coragem perante tanto sacrifício, de quem nos fala ao coração, quando, afinal, são o antagonismo das características mencionadas. Onde estão a rectidão e a constância de quem nos pede coragem?
MR