03
Set 13


http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?id_news=653322


Donald Barthelme (n.1931, Filadélfia), em “40 Histórias” (Antígona), explora o indefinível da literatura.
O autor norte-americano, fundador do “Creative Writing Program” na Universidade de Houston, é considerado um dos escritores mais importantes do pós-modernismo. E ao iniciar-se a leitura de “40 Histórias” rapidamente se percebe a razão.
A ousadia do autor na manipulação dos constituintes da narrativa breve, desde a estrutura ao recurso estilístico, é rara e consegue atingir a excelência.
Barthelme parece fruir da decomposição do primado da estrutura. O autor contraria a viciada expectativa do leitor. Nos seus textos, ele surpreende-o com o imprevisível.
A construção de imagens com efeitos imprevistos, devido à conjugação de elementos inesperados, causa estranheza e intensifica o prazer pela leitura.
“ Ah, eles divertiram-se imenso a fazer os exercícios, e nós dissemos-lhes para baixarem o traseiro enquanto rastejavam por baixo do arame, o arame era feito de citações em cadeia, Tácito, Heródoto, Píndaro...” Pág. 105

Barthelme surpreende através da sobreposição de várias realidades, do nonsense e da perspectiva cubista na conjugação dos vários elementos (vidas, efemérides, acontecimentos banais).
O leitor é obrigado a sair da sua expectável e sã realidade.
O “Barthelmismo” é surreal, labiríntico e hipnótico.
 “Tu aproximaste-te e caíste sobre mim, eu estava sentado na cadeira de verga. A verga soltou uma exclamação quando o teu peso se abateu sobre mim.” Pág. 14

O escritor norte-americano erige os seus pequenos mundos ficcionais sobre estruturas com diferenças substanciais. “A tentação de Santo António”, de estrutura clássica, contrasta com a desfragmentação de “Guarda-costas”.
A diferença entre estas duas narrativas breves demonstra a capacidade do autor em rasgar convenções e de confrontar o género literário com as suas próprias limitações.
“Guarda-costas” mostra as muitas possibilidades existentes na ficção. Neste analisa-se não o conto em si, mas as “costuras” da sua construção. Este conto é, sobretudo, uma ficção que incide, formalmente, nos caminhos possíveis antes e durante a sua construção.
O leitor observa o negativo ficcional da mesma forma que um fotógrafo analisa os negativos fotográficos das suas fotos. O realce presente nos contos existe em oposição à ditadura da forma.
Quando se pensa na apostasia de Barthelme ao cânone, é-se surpreendido com o classicismo de “A tentação de Santo António” e com um típico começo, “Deixa-me contar-te uma coisa...”, em ”Downsizing”.
Já em “Sinbad”, será a última parte do conto a iluminar a sobreposição de imagens até ali narradas.
Em “Chablis”, as vicissitudes da vida conjugal são perspectivadas com a ironia e humor típicas do “Barthelmismo”.
Em “O Génio”, temos a súmula do que é a escrita de Barthelme. O conto é elíptico, satírico e desconcertante.
A forma como o autor envolve o leitor é genial.
As suas histórias são, muitas vezes, perversas e perturbantes.

São 40 contos capazes de demonstrar que mesmo a Ficção pode ser ainda mais manipulada e testada.
Barthelme é um mestre da narrativa breve. “40 Histórias” candidata-se a ser um dos melhores livros de 2013.

Mário Rufino

Mariorufino.textos@gmail.com


publicado por oplanetalivro às 20:38



http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?id_news=647297

DuBose Heyward, escritor nascido nos Estados Unidos da América (Carolina do Sul), em 1885, é autor de um dos livros mais representativos das condições sociais do Sul, tanto materiais como psicológicas, do período pós-Secessão: «Porgy», editado agora entre nós pela Sistema Solar.


A história do negro Porgy, pedinte de “profissão” e com deficiência física (pernas) na Carolina do Sul, faz com que DuBose Heyward pertença a uma plêiade de autores, com temática pós-Secessão e/ou de características sulistas, como Margaret Mitchell, Erskine Caldwell, Carson McCullers, Truman Capote, Robert Penn Warren, Flannery O´Connor e William Faulkner.
 O autor e Dorothy Heyward, sua esposa, adaptaram o livro para um musical intitulado “Porgy and Bess”. Devido ao enorme sucesso da peça encenada por Gershwin, o próprio livro tem vindo a ser traduzido como “Porgy e Bess”.
 Aníbal Fernandes, com o seu texto nesta edição da Sistema Solar, fornece importante contextualização para a construção do sentido da obra.
 Com um enredo simples, que se concentra no essencial, “Porgy e Bess” é, além de um romance que se apoia nestas duas personagens, um retrato sociológico pós-libertação dos escravos negros nos EUA. DuBose Heyward não resiste à adopção de um certo romantismo e paternalismo, quando analisa as condições psicológicas e sociais dos negros.
 A pobreza honrada e a moralidade da microssociedade representada aproximam-se da postura de, por exemplo, Kipling (n. Índia, 1865-1936) em relação à dialéctica colonizador-colonizado/dominador-dominado, que, por sua vez, viria a ser satirizada por Coetzee (n. África do Sul, 1940- ) em “Foe”.
 “Porgy”, publicado em 1925, mantém a contemporaneidade e a relevância presente em obras mais recentes como as de Coetzee, de Naipaul ou dos ensaios de Fannon e Said, entre outras obras e autores.     
 A construção sintáctica e a utilização lexical nos diálogos da comunidade atribuem ao texto propriedades do realismo.
 “fiquei a saber quem você és... um porco danado, vendilhão das droga que dá cabo do lar dos preto feliz.” (pág. 115)

A imagética da comunidade negra é composta por uma complexa coexistência entre o cristianismo e o paganismo. Os seus hábitos são influenciados pela estrutura moral que advém dessa combinação. A canção, laudatória a Deus (Gospel) ou não, é um recurso muito utilizado, seja no lamento ou na alegria. Espelha, também, as condições sociais e evolução histórica da comunidade negra.
«Ai é mesmo duro ser preto
Ai é mesmo duro ser preto
Ai é mesmo duro ser preto
Onde tu meteu
os direito que te deram?
No colchão de pau dormi
sem melhor para desejar;
mas veio um branco dizer:
agora és livre; vai trabalhar, vai trabalhar!»
Depois, todos se lhe juntaram em coro
«Ai é mesmo duro ser preto...» (pág. 74/75)

“Porgy e Bess”, extraordinária viagem de 170 páginas pela Carolina do Sul, é habitado por personagens com capacidade para criar empatia com o leitor. Porgy é um personagem belo e invulgar.


publicado por oplanetalivro às 08:19

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