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Nov 12

«Mazagran - Recordações & outras fantasias» (Quetzal)





J. Rentes de Carvalho não perde uma oportunidade para contar uma história.
 “Mazagran - Recordações & outras fantasias”, livro composto por crónicas, muitas delas em formato epistolar, não desilude quem já conhece o autor e tem a capacidade de surpreender quem ainda não o conhece.

Mazagran, bebida típica do Maghreb e composta por café forte, limão, açúcar e água gasosa, é um estímulo para a conversa entre convivas. É um pretexto para a partilha de histórias. A bebida também leva, segundo o escritor, um pouco de conhaque quando o profeta está distraído. Este tipo de irreverência está presente nos 104 textos que constituem este livro.
“ Além disso, devo dizer que na tua idade - vais fazer dezasseis? - Não há nada de alarmante em querer liquidar os pais. Eu próprio comecei a «matá-los» quando tinha uns doze anos e, curiosamente, também por causa da Páscoa” Pág. 21
Nesta obra é mantido o registo sarcástico, rabugento e sapiente que pode ser encontrado em dois livros do mesmo género literário: “Com os Holandeses” e “Tempo Contado” (Grande Prémio de Literatura Biográfica APE/CM Castelo Branco 2010/2011).
O trabalho sobre a linguagem é uma característica que, pela constância tanto em ficção como em não-ficção, dota a obra de Rentes de Carvalho de homogeneidade e notável qualidade.
 Em “Mazagran…”, Rentes de Carvalho  consegue envolver o leitor da mesma forma que conseguiu em “Os Lindos Braços da Júlia da Farmácia” (narrativas curtas), “O Rebate” (romance), ou em “Com os Holandeses” (Crónicas).
 As suas memórias são salvas do esquecimento e formalizadas na prosa que, por ter um ritmo próprio, se identifica como criação de Rentes de Carvalho. O contexto social mantém-se, principalmente, na Holanda, Portugal e Brasil.
Na crónica “O prazer da viagem”, o autor relaciona o tamanho do mundo com a velocidade com que um indivíduo o consegue percorrer. As viagens longas são cada vez menos viáveis na contemporaneidade. Essa redução de velocidade influencia a noção de distância, reduz a imprevisibilidade e tem, consequentemente, importância na experiência individual e respectiva rememoração.
A viagem, como suspensão de uma realidade para a vivência de uma outra, torna-se mais curta e mais formatada.
Em “Diários” o escritor confronta-se com o seu passado, quando analisa a evolução da sua consciência ao longo do tempo. O medo do ridículo e a difícil dialéctica entre o “eu” presente e os “eus” que foram desaparecendo, em “mortes” sucessivas, estão espelhados nas páginas desta crónica.
“O diário que recebia os meus segredos, o confidente silencioso e discreto, era afinal o mais cruel dos espelhos: apenas capaz de reflectir a imagem incorrigível do passado (...) O que verdadeiramente me dita urgência, porém, é o temor de que um acaso maléfico - a morte súbita, a paralisia - coloque o meu «espelho» em mãos alheias. Que outros vejam reflectidas nele as mil imagens que quero esquecer e que, antes de poder fazer em paz o enterro do meu velho «eu», alguém o transforme em divertimento de praça pública” Pág. 173
O autor não está camuflado pela ficção.
O texto “Para Romário de Souza Faria”, o futebolista, é demonstrativo da mordacidade que a escrita de Rentes de Carvalho pode alcançar.
“À semelhança daquele escritor que, quando lhe perguntaram o que é que ele pensava da literatura, respondeu: « Eu sou a literatura!», você com certeza sente que é o futebol” Pág.284

Todos os textos de “Mazagran - recordações & outras fantasias”, apesar de algumas inevitáveis oscilações, são dignos da qualidade com que o escritor já habituou os leitores em Portugal.
Outrora conhecido essencialmente na Holanda, Rentes de Carvalho já conquistou o “espaço” na Literatura Portuguesa compatível com a excelência literária dos seus textos.


Mário Rufino
Mariorufino.textos@gmail.com


Mazagran - Recordações & outras fantasiasMazagran - Recordações & outras fantasias by José Rentes de Carvalho
My rating: 3 of 5 stars

O meu texto, para o diário Digital sobre "Mazagran - Recordações e outras fantasias"

http://oplanetalivro.blogspot.pt/2012...


3 estrelas em comparação com livros mais importantes na bibliografia do autor. Dentro do género - crónicas- vale mais. É um grande escritor

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publicado por oplanetalivro às 11:40

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