23
Mar 12


Num curso para Erasmus, normalmente, os alunos não estão para se "chatear" muito com o estudo da língua. Querem aprender o essencial para depois dizer umas frases e umas asneiras aos amigos e à família, quando voltam a casa. Há excepções, claro...
A primeira semana é sempre algo complicada: A vergonha amarra, não sabem os nomes uns dos outros, as nacionalidades, os cursos... Depois, lá para o meio do curso, mudam de lugar, existem casais, manhãs difíceis devido a noites mal dormidas, ou sem uma hora de sono...

 No começo de determinado curso para Erasmus, eu disse-lhes o que iríamos fazer, como sempre faço, mas se tivessem alguma necessidade mais urgente, poderiam perguntar-me na aula, pois seria bom para todos.
Passadas duas semanas, mais ou menos, um aluno (não me lembro de qual nacionalidade) disse-me que tinha algumas dúvidas de vocabulário. E começou a dizer:
Hair -cabelo
eyes - olhos
Beautiful - homem ou mulher?- Woman- Bonita

(e eu a ver aonde ele queria chegar...)

mouth- boca
Lips- Lábios
Clothes- Roupa
Undress- formal ou informal :D? Informal- Despe-te

Acabei por dizer :" No fim da aula ensino-te umas frases"

Espero tê-lo ajudado... Pelo menos não lhe faltou motivação até ao fim do curso...

MR


publicado por oplanetalivro às 18:37
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22
Mar 12


ENTREVISTA A MANUEL MOYA SOBRE “CINZAS DE ABRIL”
Para Revista "Os Meus Livros" de Março (número não editado)





Enfrentar a memória e a culpa

Manuel Moya conseguiu em “Cinzas de Abril” uma obra literária de elevada qualidade.

A estrutura narrativa maximiza os pontos dramáticos de um enredo muito bem construído. O autor mostra muita segurança em todo o livro e ficamos com a ideia de que se a história fosse contada de outra forma, não teria tanto impacto.
As personagens, psicologicamente complexas, confrontam-se com o que são, com a ansiedade do porvir e, por fim, com a sua própria memória.
É um livro de desencontros entre pessoas, entre ansiedade/esperança e os factos, entre a memória e a aceitação da realidade. Acompanhamos o medo dos interrogatórios da PIDE, o estertor final do período de Marcelo Caetano, a ilusão e esperança que vieram com a revolução, a confusão social e política nos anos seguintes até chegarmos à década de 90.
É neste espaço temporal que Manuel Moya põe diferentes personagens, com distintas posições sociais e políticas, em confronto. A pluralidade de pontos de vista permite-nos acompanhar a evolução individual e, simultaneamente, social.
 No fim, cada personagem está entregue a si mesma:
“Creio que chegou o momento de abrir a mala e de começar a liquidar as dívidas contraídas com o passado(…)”


Há uma ligação forte entre si, Lisboa e Literatura Portuguesa. Ao ler, pareceu-me que Manuel Moya tinha um mapa de Lisboa na mão e Fernando Pessoa na mente. Como é que se iniciou essa relação com Lisboa, Pessoa e, também, Sophia de Mello Breyner?

MM- Na realidade, resido muito perto da fronteira portuguesa. Portugal é uma referência natural em mim. Lisboa é uma cidade que frequentei no fim da minha adolescência e que me fascinou. [Fernando] Pessoa é um autor de referência permanente em mim. Li menos Sophia, mas é também uma grande poetisa.


A narração proporciona imagens muito fortes, descritivas, diria mesmo cinematográficas. Captou, também, a melancolia que, muitas vezes, nos [portugueses] domina. Que tipo de pesquisa fez para escrever este livro?

MM- Não fiz nenhum tipo de pesquisa. Nem sequer tomei notas. Tenho Lisboa na cabeça. É uma cidade que frequento e com a qual tenho uma especial relação afectiva.

Existe, hoje, algum afastamento da geração pós-25 de Abril em relação à revolução. O que o levou a contar uma história tão ligada a esse momento?

MM- Bem, conheci Lisboa no momento imediatamente posterior. Todavia era palpável a atmosfera do pós-25 de Abril. Creio que foi um momento mágico, não só na história portuguesa, mas também europeia. Até a história espanhola cambiou a partir desse dia. A nossa transição não é pensável sem a sombra do 25 de Abril. O 25 de Abril foi a última revolução romântica, a filha mais formosa da [Revolução de] 68


“Cinzas de Abril” conquistou o Prémio XI Unicaja Prémio Romance Fernando Quiñones 2010” para o qual, se não me engano, concorreram obras de diversos países como Argentina, México, EUA, Chile, Alemanha, França, Cuba, Costa Rica e Roménia.
A 1ª pergunta que me surgiu quando comecei a ler o livro foi “Quase 38 anos depois da Revolução o que poderá ser dito que ainda não foi dito?”
Poderá o lugar de onde se vê [escritor espanhol, residente em Espanha] e o tempo passado serem elementos importantes para se contar esta história?

MMNa realidade, Cinzas não é propriamente uma novela histórica, se bem que, claro, se desenrola em um momento crucial da nossa história, mas eu creio que é uma novela que fala mais de indivíduos presos a um tempo crucial do que outra coisa. Pelo menos assim gostaria que fosse.


A não-linearidade da narrativa potencia a vertente dramática. Noutro prisma, a pluralidade de “ângulos” sobre os acontecimentos narrados dá-nos diferentes perspectivas de um período da história de Portugal. Teve sempre em mente esta estrutura? A incidência da narração sobre diferentes personagens pareceu-lhe sempre a melhor opção? Os “passos” fulcrais estavam presentes na concepção do romance?
MMBem, dado que é uma novela coral, de onde operam personagens distintos, cenários distintos e períodos distintos na vida desses personagens, pensei que a estrutura devia adaptar-se a essa complexidade, mas não estava de todo na cabeça. As novelas costumam rebelar-se quando o autor é demasiado rígido nas suas concepções.



Durante o romance, o leitor tem uma perspectiva interior (“eu-narrativo”) e exterior (quando vê Ilídio, por exemplo). De quem é esta “voz” que nos fala na 1ª pessoa e que, se não me engano, não chega a ser nomeada?

MMBem, o narrador é só o narrador. É certo que não aparece o seu nome, mas esse é um elemento que aproxima o leitor da narração, pois parece que é ele que conta a história. Interessa-me sempre que o leitor intervenha na leitura.


As personagens sofrem muitas alterações no campo afectivo, ideológico, intelectual. Houve a preocupação em não condenar nem absolver cada uma das personagens?
MM- Na realidade, numa ditadura todos são vítimas. Uma ditadura só pode suster-se com a mentira e o terror. Torturadores e torturados são vítimas do sistema. Com isto não quero justificar nada, nem absolver a tortura nem quem a exerce, mas no fundo uns e outros são “vítimas” da barbárie que representa uma tirania.


Há uma determinante força social sobre a vontade individual. Sophia não se adapta. O narrador adapta-se. Em consequência, os destinos são muito diferentes. É ambivalente: A inadaptação às regras (antes do 25 de Abril) levou à revolução. A mesma inadaptação à realidade teve um desfecho trágico para Sophia. Estaremos condenados, mais cedo ou mais tarde, a nos adaptarmos à realidade, por mais hedionda que seja, para sobreviver? Não foi isso que Ilídio (elemento da PIDE) fez durante o regime de Marcelo Caetano?

MM- Existe algo disso, sim… No fundo não somos mais do que sobreviventes. Uns adaptam-se ao espaço ou ao tempo para sobreviver. Mas, afortunadamente, existem indivíduos que se rebelam, que saltam sobre o estabelecido. Eles são os motores do pensamento e do mundo. Fernando e Sophia são assim. Mas depois da rebelião não há marcha atrás e quando há só pode ser terrível.


Sophia sente muitas dificuldades de adaptação. Em Paris, ela era a estudante estrangeira; em Portugal, a angolana retornada, a africana branquinha, a estudante parisiense. Esta inadaptação capta, de certa forma, várias vertentes de desajustamento (a emigração, o retorno, o exílio). Ela nunca consegue ultrapassar as “cicatrizes” do período que durou desde o período marcelista até à pós-revolução. Sophia simboliza a divisão social e anímica da época marcelista? Terá a sociedade portuguesa ultrapassado a (des) ilusão de Abril?

MM- É uma maneira interessante de situar a Sophia. Sophia é a permanente estrangeira. É estrangeira em todas as partes. Sem dúvida que é uma vítima do Estado Novo, mas não tenho a menor dúvida de que é também uma vítima desses governos burgueses e conservadores que destroçaram as conquistas da revolução. Sempre acreditei que Portugal fez uma revolução para que seguissem mandando, ao fim de dois, três anos, os mesmos que foram derrotados. Ela deu tudo e depois ficou de fora, como aconteceu, também, com Otelo e tantos outros. A sociedade portuguesa devia mirar com maior interesse o seu 25 de Abril. Hoje mais do que nunca o 25 de Abril pode ser um símbolo, uma referência. A sensibilidade do 25 de Abril é algo que os portugueses e os que não são portugueses deveriam manter viva, quando a tirania do mercado ameaça tudo quanto conseguimos nos séculos XIX e XX.

O encontro entre Ilídio e o narrador é um acerto de contas com o passado.
“Creio que chegou o momento de abrir a mala e de começar a liquidar as dívidas contraídas com o passado (..)” Pág. 324
Teremos nós liquidado as contas com o passado? Como escritor e observador atento da realidade portuguesa, qual é a sua opinião?

MM- Bem, simbolicamente, é assim. O encontro entre o narrador e o velho colaborador da PIDE supõe uma espécie de trégua, de liquidação de um tempo passado. Há que mirar em direcção do futuro, parecem dizer.


Traduziu Saramago, Pessoa, Sophia de Mello Breyner, Lídia Jorge, Miguel Torga, Mia Couto… Qual é a sua opinião sobre o momento que a Literatura de Língua Portuguesa vive, actualmente? Há algum escritor que gostasse de traduzir?

MM- Honestamente, não tenho uma opinião muito fundada sobre a actualidade da Literatura em Língua Portuguesa, como não tenho sobre a espanhola ou italiana. Estou habituado a ler autores portugueses e afrolusos e sinto-me numa certa irmandade com eles. No que respeita a tradução, direi que quando traduzi “Livro do Desassossego”, talvez o melhor livro do século XXI, fiquei suficientemente satisfeito por um bom tempo. No entanto, gostaria de traduzir [José Eduardo] Agualusa ou as novelas e contos de Torga, porque não?


Mário Rufinomariorufino.textos@gmail.com



publicado por oplanetalivro às 08:43

18
Mar 12





 
Estamos todos habituados a ver, tanto nos Estádios como através da televisão, o futebol rico em gel, marcas desportivas, carros para transportar a ronha de quem levou um sopro e parece que partiu uma perna. Estamos habituados a ver futebol. Mas isto não é REALMENTE o futebol. O verdadeiro jogo cheira a couratos, chouriço assado e é acompanhado pelas minis, uma verdadeira cultura bebível. Aqui se mantém a essência do futebol. Hoje, paga-se para praticar. Quando eu jogava futebol tínhamos (o escândalo!) de ter algum jeito para aquilo. Isso e capacidade de sofrer.
Confesso que mais do que o medo de me magoar era ter de passar pelas mãos daquele massagista. Uma vez tive de ser substituído ainda na primeira parte. Não conseguia pousar o pé  nem calçar a bota. O remédio era sempre o mesmo: dói? Mete gelo. Está partido? Mete gelo.
Mas não é sobre mim o que vou dizer, embora tenha visto o episódio bem de perto.
Num pelado, como já há poucos, um colega levou uma “paulada” de tal forma que se enrolou pelo chão, levantando uma nuvem de pó de onde saiu um profundo e doloroso “AAAAAIIIIIIIIIIIIIIIIIII”
Lembro-me de ter pensado: “já foste!”
Cheguei junto a ele, vi o cartão vermelho dado ao adversário, e disse aquela frase que cai sempre bem: “desviem-se, desviem-se, deixem-no respirar”
O carniceiro que tínhamos como massagista lá chegou…
“ Atão!!! Onde foi?!!”
“No pé direito”, disse o meu colega enquanto as suas mãos escondiam a cara.
O carniceiro começou a mexer-lhe no pé.
“NÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃOOOOOOOO”
“Achas que está partido?”, perguntou o massagista.
“Não merda!!!! Não é esse pé!!!!! É o “outro” direito!!!!”
Corrigido o erro, puxou da lata de spray milagroso.
Para quem não sabe, o spray parece que espeta da pele ao osso. Antes de desaparecer, a dor estrebucha e castiga.
O carniceiro abanou a lata e carregou no botão e ouviu-se “Pssssssssssssssssss”. O meu colega calou-se. Eu bebia água à espera de que ele fosse substituído. “Já foste…”
De repente, ele tirou as mãos da cara, espreitou para o pé e disse: “Mas que merda é essa!!!! Não está a sair spray nenhum!!!! Estás a fazer Pssssssssssssss com a boca!!!
“Cala-te”, disse o carniceiro. “O spray é bom. É spray espanhol”

O árbitro ria-se com vontade, os adversários riam-se de nós e a lata bem podia ser de laca para o cabelo.
Cinco minutos depois, o meu colega foi substituído.

publicado por oplanetalivro às 21:09
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Ser professor de língua estrangeira tem coisas engraçadas. Além de gostar muito, pois ensino a minha língua e cultura e aprendo imenso, fico perante algumas situações... embaraçosas:
Houve uma aula em que uma aluna entrou com um ar pensativo e com um pedaço de bolo na mão. Ela já estava no nível limiar e, por isso, já conseguia satisfazer as suas necessidades mais importantes.
Antes de começar a aula, veio falar comigo:
"Mário... não percebo o que aconteceu", disse antes de dar a última dentada no bolo.
"Tive fome e fui ao café pedir bolo. Quando pedi, o homem riu-se e disse «é pa já».
"O que é que tu disseste?", perguntei.
"Disse «queria uma queca, se faz favor»"
"Queque..", disse eu
"Queque? Não... eu disse Queca"


Deixei-a comer o resto do bolo, antes de lhe explicar...não fosse ela engasgar-se.
Depois ensinei-lhe outra palavra: corada...
MR


publicado por oplanetalivro às 18:49
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14
Mar 12

“Por Este Mundo Acima”
I
“A amizade é um amor transfigurador e potente. É uma arma.”
Pag. 127
Patrícia Reis oferece-nos um livro optimista, onde a amizade é a verdadeira reconstrução num mundo destruído. No seu 6º romance, transporta-nos para um mundo pós apocalipse e arruinado em estruturas e emoções. A sobrevivência é imperiosa e o Homem regride à sua condição de animal.
Nas primeiras páginas, a autora demonstra que existem relações produtivas e explícitas (intertexto) com outros textos. Neste caso, existem relações identificadas com textos de Fausto, «Por este rio acima», e com Brecht, «Do pobre B.B.». Por ser um livro que aborda directamente o papel da literatura na sociedade, existem outras aproximações a outros autores com a subtileza exigida, ou não, pela própria autora. “Por este mundo acima” é um livro que dialoga com a literatura; não é fechado em si mesmo, mas antes abre possibilidades de leituras a outros livros. De outra forma, pode-se afirmar que existe abertura do texto ao pensamento sobre a historicidade e sociedade onde o Homem se insere e influencia.
A narração é sobretudo psicológica e não pude deixar de me lembrar de “Fome” de Knut Hamsun e de “Ensaio sobre a cegueira” de José Saramago (Saramago começa, no entanto, com uma impossibilidade, ao contrário de Patrícia Reis). Assim sendo, a narração ocorre na 1ª pessoa do singular. Esta perspectiva confere uma maior proximidade do leitor ao pensamento do personagem Eduardo (principal narrador). A sua visão sobre as outras personagens será a nossa, também, uma vez que não existe uma entidade omnisciente e concretizada numa 3ª pessoa. No entanto, através da estratégia narrativa de uso de cartas/apontamentos (aqui temos o diferimento da mensagem que abordaremos mais à frente) a autora dá-nos a oportunidade de estarmos mais próximos das emoções e ideias de uma entidade essencial no livro: Sofia. É sobre ela, não exclusivamente mas principalmente, que incide o espírito de tolerância das outras personagens, individualmente e como grupo. É por este meio que descobrimos os acontecimentos da sua vida que influenciaram a sua formação emocional. A aceitação das suas características e o amor que todos sentem por ela é a chave de leitura deste texto. É este tipo de amor que pode levar o Homem à sua salvação. A relação entre eles é de longa data: “ Há mais de trinta e tal anos que falamos das listas do Eduardo” pag.79. E a interdependência emocional é partilhada por todos.
Mais do que um texto musical, construído com frases mais longas interrompidas por frases mais curtas originando mudanças de ritmos, diria que o texto é, sobretudo, fílmico devido à construção de imagens fortes e sugestivas.
A nível temático, o texto relaciona-se com os factores externos (contexto) a si próprio, fundamentando a sua produção, recepção e interpretação em acontecimentos possíveis. Nunca ficamos a saber o que realmente aconteceu. Nem é importante. O que o texto nos transmite é a ruptura com um passado (contexto situacional), um apocalipse que reduz o ser humano à sua essência, ao seu instinto de sobrevivência (universo simbólico).
“O meu corpo estremece. Não o controlo. Vejo as mãos suadas e tento continuar. Sou um animal. Regresso a isso” pag. 126
“É fundamental deixar de pensar”pag.124
Posteriormente, é sobre este movimento niilista que se constrói a salvação, a aceitação e, essencialmente, a elevação do melhor do Homem: A amizade como amor, como dedicação ao próximo em detrimento das próprias necessidades (visão do mundo). Segundo Levinas, o altruísmo, a decisão de colocar o Outro em primeiro lugar pode atenuar o terror da existência. Essa é a nossa transcendência. É esse terror que existe ao longo do livro de Patrícia Reis e é o amor, composto por altruísmo e inclinação para o Outro, que o pode atenuar, sem o derrotar.

II
O homem constrói, permanentemente, narrativas. o Homem constrói um texto narrativo quando fala do seu percurso de vida, da história clínica, ou quando conta algo a alguém. Assim sendo, não pode viver sem a produção e recepção desses mesmos textos. Eduardo tem essa percepção e insiste, permanentemente, em recordar/narrar os acontecimentos passados e, principalmente, dar a conhecer a sua memória, os acontecimentos que o marcaram, a Pedro.
“ Ele fazia lista de livros que era importante circular. Livros luminosos que, não sendo lamechas, nos revelavam a vasta matéria dos sentimentos que definem a condição humana”pag.164
Segundo Aguiar e Silva (1990), « a narratividade encontra-se intimamente correlacionada com o conhecimento que o homem possui e elabora sobre a realidade- o Génesis pode-se considerar, sob esta perspectiva, como a narrativa paradigmática e primordial -, devendo ser sublinhado que lexemas como “narrar”, “narrativa” e “narrador” derivam do vocábulo narro, verbo que significa “ dar a conhecer”, “tornar conhecido”, o quel provém do adjectivo gnarus, que significa “sabedor”, “que conhece”, por sua vez relacionado com o verbo gnosco(pp. 201
A narração é indissociável do tempo. Uma característica interessante de “Por este mundo acima” é o facto de a narração ocorrer no futuro, no espaço de um mundo possível, viajando entre o passado (tempo presente do leitor) e o presente do narrador (tempo futuro do leitor). Entre os vários marcadores temporais que nos fornecem essa informação, além do sistema verbal, há um que pretendo sublinhar: A referência ao próprio livro de Patrícia Reis remete-nos à actualidade e indica que ele narra no futuro. E este aspecto é intrigante porque um texto escrito é uma forma de diferimento da mensagem. Através da escrita pode-se perpetuar, ou pelo menos assegurar a permanência no tempo, da mensagem. O personagem adjectiva o livro de “datado”, isto num diálogo sobre o Facebook , o MSN e o Youtube. Ou seja, podemos utilizar esta referência como “ a leitura do texto”, necessariamente mais próxima desse futuro possível; ou como a “edição do texto”, mais afastado desse futuro apocalíptico.
A narração situada no futuro levanta uma outra característica importante e coerente com a temática de “Por este mundo acima”: A presença do verbo “Ser” no futuro é uma vitória, ainda que escassa e ténue, sobre a morte. E o texto é isso mesmo: uma narração no futuro que encontra os seus alicerces no passado para, com esperança e renovação, continuar a adiar a morte definitiva dos valores culturais do Homem e, por fim, dele próprio.
A morte da memória ou a ignorância invalida a continuação da história. Analise-se a conjugação verbal da seguinte frase: “O homem da gabardina bege terá uma história e eu gostaria que alguém me contasse tudo em pormenor” pág. 93
A probabilidade desce do futuro imperfeito até ao imperfeito do conjuntivo… porque não há ninguém para contar.

III
“Voltámos ao princípio e até temos um livro para nos guiar” pág. 157
A reorganização social começa quando Eduardo encontra uma criança: Pedro. E devido ao poder transformador deste personagem, a autora divide o tempo em antes e depois do apocalipse:
“O caos aconteceu quando ele andava pelos quatro anos de idade, quase cinco. Fizera os 8 há dois meses”. Pag.114
Pedro é um recomeço, é um exemplo de generosidade num mundo destruído pela falta de comida, de água, de higiene e falido de cooperação e altruísmo: “Ele parte outra bolacha em quatro, desajeitado, e oferece-me dois pedaços” Pag. 119
Pedro incentiva Eduardo a quebrar o seu medo de convivência, de partilha de um espaço e diálogo com outros sobreviventes. E assim conhecem Miguel, jornalista, que vagueia pela Península Ibérica transportando notícias. Este personagem, aparentemente secundário, tem um papel importantíssimo na história: Ele é o responsável pela interacção entre os povos, pois é ele que transporta as notícias sobre os outros, os sobreviventes. Miguel é o mensageiro (apóstolo?).
“ A sua vida resume-se a ter estado sozinho, a recolher histórias para depois partilhar. Não criou raízes, não se deixou ficar num qualquer outro lugar. Partiu à procura de algo de melhor que possa, um dia, trazer de volta uma certa ideia de humanidade” pág. 161,162
A reorganização vai-se consolidando. Os anos passaram e com eles veio a capacidade da sociedade se organizar. São mencionados progressos em países distantes.
Pedro descobre as caixas com as recordações escritas de Eduardo. A memória de Eduardo sobrevive, através de várias caixas com textos que foi armazenando desde a infância, na interpretação e na memória de uma criança. A memória individual é transmitida, desta forma, para as mãos e memória individual de Pedro. Mas não chega. Era imperativo a sociedade, que tem a força de uma personagem, manter a sua memória colectiva de forma a não repetir os erros do passado:
“ Decidiram passar a biblioteca da avó de Eduardo para um centro cultural, para estar sempre disponível, para ser a memória de todos” pag.180.
Pedro começa a recriar o alfabeto, primeiro passo para a impressão em papel, e, além do livro de Sebastião, outros livros foram escritos e difundidos pela nova sociedade que emergia dos escombros. Miguel, o jornalista, fala com Eduardo sobre a escrita de um novo manuscrito, uma história sobre o presente, a nobreza, onde a linha do Bem e do Mal se distingue (O Novo Livro/Testamento). A revisão do livro foi a última tarefa de Eduardo.
- O livro como salvação
 Na cultura judaico-cristã, como afirma Victor Aguiar e Silva (1990), texto significa obra escrita, o livro, obras religiosas detentoras de autoridade. Na idade média, texto significa a obra do autor, ou seja, obra da pessoa que exerce autoridade. Até ao século XXI, o termo texto não apresenta uma mudança de significado, embora tenha ganhado alguma ambiguidade semântica.
A autoridade emana do livro de Sebastião. É uma obra-prima, segundo Eduardo, e, mais do que isso, é o livro que transporta o passado recente para o futuro. É a continuação temporal, a passagem cultural do que aconteceu antes do acidente. Pedro, já mais velho, é muito céptico em relação a esta hipótese: “Não é um livro orientador, é uma ficção e isso é claro, é uma parábola do tempo em que foi escrito e um achado futurista adequado às circunstâncias»pág. 157
E numa frase simples e ingénua interroga o leitor e o próprio texto: “Voltar ao princípio? Será possível? O que é o princípio?” pag.157
Estamos perante a dúvida a que Steiner, em “Gramáticas da criação”, responde: “Já não temos começos”. Mais: Nas palavras de Pedro, há um reflexo das dúvidas do Homem em relação aos Evangelhos, ao livro orientador e fundador da moral cristã. É no livro de Sebastião, hipotético pilar da refundação social, que incide o debate entre Pedro e Eduardo.
Este livro representa um caminho, individual e/ou colectivo, para o sentimento mais nobre do Ser Humano: Bondade.
“É urgente ensinar a partilhar, Pedro. Para não voltarmos ao mesmo. A Sofia, o Jaime e o Lourenço sabiam o que era bondade. Não por serem bondosos, repara, mas por o saberem distinguir e praticar no dia-a-dia sem se fazerem notar”
Pág. 170

Bibliografia:
REIS, Carlos; LOPES, Ana Cristina M. Lopes (2000) “Dicionário de Narratologia”, Coimbra, Almedina
AGUIAR E SILVA, Vítor Manuel de (1990) “Teoria e Metodologias Literárias”, Lisboa, Universidade Aberta.






Mário Rufino








publicado por oplanetalivro às 19:19

12
Mar 12


Valeria Luiselli, autora do surpreendente «Rostos na Multidão», editado pela Bertrand, foi editora do magazine literário online «Letras Librés», publicou crítica literária, traduções de poesia e ensaios. E se há casos em que vale a pena mencionar dados biográficos de autores, este é, necessariamente, um desses casos...
A sua experiência em todos os aspectos profissional é parte integrante do excelente romance de estreia de Valeria Luiselli, «Rostos na Multidão», um romance onde a realidade e a ficção evoluem no mesmo plano. No decorrer da sua investigação, a própria narradora coloca-se como alvo de análise e a tradicional observação autor-personagem ganha um sentido contrário, uma observação personagem-autor, dotando o livro de maior complexidade. A estrutura da narrativa evolui em várias temporalidades. O dinamismo da prosa contrasta com a claustrofobia da narradora que, de forma aproximada a Dickinson, escreve sem sair de casa e é alvo de agressividade passiva tanto do exterior como do interior do seu pequeno espaço. A autora teve a amabilidade de conversar connosco e, como poderão ler nas suas declarações, iluminar aspectos essenciais da sua criação. Valeria Luiselli demonstrou uma segurança e qualidade incomuns para uma estreia. É um nome a seguir com muita atenção…


É o seu primeiro romance?

Romance, sim. Tenho um livro de contos e ensaios. [«Papeles Falsos»].

Este livro é quase uma ficção sobre literatura…

Sim, efectivamente.

Há um jogo entre o autor, a personagem e o leitor. Começam com alguma separação, mas vão ficando cada vez mais próximos.
Sim, completamente. Dentro do livro há um leitor que vai lendo um livro. A sua leitura vai modificando-se no próprio decurso do livro como sucede com um leitor.
A imagem da autora está muito «colada» à narradora. Expõe-se muito e joga com a fronteira entre realidade e ficção…

Sim… O fundamental é que é um livro sobre o processo de escrever um livro. Não é só isso… conta uma história, mas é um livro onde me interessava ser transparente com o processo de trabalho; interessava-me evidenciar a maneira como incide a ficção na realidade… como a ficção modifica a realidade, não só como modificamos a realidade para construirmos uma ficção, mas também vice-versa, como a ficção toca a realidade.

O que significa «Ingrávidos» [título do livro em castelhano]?

Não é uma palavra muito comum. A palavra significa algo que não tem peso…

O título em português [«Rostos na multidão»] é um pouco diferente…

Sim, mas também é meu. Para a edição em inglês escolhi o título «Faces in the crowd», que é um verso de Ezra Pound: 
«The apparition of these faces in the crowd;
Petals on a wet, black bough»
São dois versos que formam parte importante da ficção.

…estamos a falar do momento em que ele [Ezra Pound] está no metro, escreve um longo poema e depois reduz…

Sim, é um pouco lenda, um pouco verdade, não se sabe… Ezra Pound, no Metro de Paris, crê ver um amigo que teve e procura-o. Pouco tempo depois sabe que ele tinha morrido. A história, não minha, em torno desse poema de Pound é que, supostamente, Pound escreveu um poema muito grande sobre esse acontecimento e depois deu-se conta de que o poema não capturava a essência desse instante; então reduziu-o a duas linhas. Traduzi esse verso «faces in the crowd» para português e para italiano.
De alguma maneira captura a essência de perda de identidade definida em redor de uma multiplicidade de vidas que uma pessoa tem…. Vai–se sendo muitas pessoas e tem-se muitas mortes…

Se não se importa vou ler uma passagem do seu livro, pois penso que capta a sua visão/visões sobre o texto: «Li uma vez num livro de Saul Bellow que a diferença entre estar vivo e estar morto reside apenas no ponto de vista: os vivos olham do centro para fora, e os mortos da periferia para algum tipo de centro» (página 32). A partir daqui, tive a sensação de que, ao longo do livro, há dois tipos de observação: a observação da autora sobre as personagens e outra que é das personagens sobre a autora. Há uma dupla avaliação e a própria autora também é uma personagem. Por que é que se colocou como «objecto» de análise?

Tentei muitos pontos de vista, muitos espaços de enunciação para contar o que tinha a contar. Descartei muitos porque não funcionavam e depois de um ano a tentar distintos lugares, desde onde contar esta história - uma grande pergunta durante um ano: «Desde onde posso realmente contar esta história?» -, o resultado, depois de muitas provas, foi a de uma personagem que narrava desde um espaço íntimo, muito fechado. A narradora que vive numa casa e narra sempre do mesmo espaço, muito pequeno e confinado. O presente absoluto é narrado nesse espaço e isso permitiu-me sair e explorar muitas temporalidades, pelo menos quatro diferentes: Nova Iorque do passado recente; Nova Iorque de um passado remoto, dos anos 20; Nova Iorque dos anos 50… Encontrei um centro a partir do qual girava o livro. Este centro permitiu-me ter uma grande liberdade para construir uma novela de muito movimento, com troca de vozes, troca de perspectivas.

Há uma parte em que ela fica muito embaraçada quando o marido lê parte do que ela vai escrevendo. O marido representa, de alguma forma, o leitor?

Eu creio que sim. De alguma maneira representa… nem sempre as personagens desta novela representam coisas, mas suponho que, em alguma medida, sim. Elas não são formas ocas que representam significados. Eu trato de trabalhar com coisas muito humanas, não com personagens que representam valores e símbolos. As minhas personagens não são simbólicas, embora algumas das suas acções tenham um alcance maior e que se podem ler simbolicamente ou metaforicamente ou abstractamente. E sim... Digamos que a leitura do marido vai perguntando sobre os limites da ficção. Os limites da realidade estão ligados à criação do leitor, à minha experiência própria como leitora, que está sempre investigando de uma maneira detectivesca… buscando…

…como um «voyeur»…

Como um «voyeur», exactamente. É uma figura externa que influencia o decurso da ficção, mas que tem sempre uma visão externa.

De alguma forma, todos eles, incluindo a criança, são criadores e leitores dos próprios acontecimentos. Se virmos a realidade e a ficção como um enorme texto, todos eles interpretam.

Absolutamente. Por outro lado, eu queria construir uma personagem, particularmente a narradora, mas também Owen, que estivesse muito ameaçada, cercada, por tudo. Há uma violência muito subtil, um mundo passivo-agressivo em redor da narradora. Nesse mundo os filhos são asfixiantes. Existe o marido zeloso… Ela não sai de casa, mas escuta o rádio do vizinho e são puras notícias horríveis; então há um mundo que está à porta de sua casa e que ela não quer e de alguma maneira a encerra. É um mundo muito claustrofóbico.

A certa altura, a criança dorme e ela vai ver se a criança respira, acabando por dizer «…mas eu tenho falta de ar». De uma forma mais abstracta, esse tipo de responsabilidades, a nível familiar, não se compatibiliza com a criação literária ou com outro tipo de criação?

Eu creio que sim, que se compatibiliza. Como adultos temos que encontrar as formas para sobreviver, para poder ser bons pais, pessoas completas.

Além desta situação em que ela olha para a criança, a certa altura também diz: «Os romances são de um fôlego. É isso que os romancistas querem. Ninguém sabe exactamente o que significa, mas todos dizem: de um fôlego. Eu tenho uma bebé e um menino do meio. Não me deixam respirar. Tudo o que escrevo é – tem de ser – de vários fôlegos. Pouco ar.» (página 14).

Esta pessoa está muito assediada por tudo. De uma forma mais ampla… os meninos são do mais luminoso. A paternidade é muito complexa. Há lugares muito difíceis e há coisas muito luminosas também. Eu descobri enquanto escrevia este livro de que a única maneira de lidar com as dificuldades era incorporá-las na novela. Foi assim que pude atravessar um período difícil de maternidade recente.

É muito sincera e honesta na escrita do livro…

Não é um livro, neste sentido, autobiográfico, mas é um lado da paternidade de que não se explora muito. Há muitas novelas maravilhosas sobre a relação pai-filho, mas poucas novelas retractam a relação entre maternidade e a criação… como se fosse um tema demasiado feminino, mas os pais também atravessam essa dificuldade.

Percebi vários tipos de relação no texto: a relação entre autora/narradora e outros autores, como Ezra Pound, Dickinson… Existem referências constantes a outros autores. Que tipo de influência sente em relação a esses autores? Há uma tentativa de se «separar» deles ou de os «incorporar»?

Somos leitores profissionais ou, pelo menos, leitores constantes e dedicamos uma boa parte da nossa vida a ler. Temos uma relação com os escritores de uma certa fantasmagoria no sentido em que quando lês também é uma conversação com um autor, de alguma maneira… Para exemplificar de uma maneira simples: vim a Lisboa, mas já tinha lido muito Pessoa e quando caminhei pela primeira vez por Lisboa reconheci o nome das ruas, acredito ter reconhecido os espaços e a sensação que tive, era como se já tivesse estado aqui. E através de Pessoa.

Primeiro entrou na alma e depois nos sítios…

Exactamente… Lemos e vivemos através da leitura dos livros e somos mediados por presenças, vozes, companhias. Interessa-me incorporar e viver perto das vozes que me marcaram e ignorar as outras.

O livro abre várias janelas para outros autores. Não se encerra nele próprio. A partir do seu livro podemos a chegar a outros autores…

A mim isso interessa-me muito… Não de uma maneira pedante, didáctica, mas interessam-me os livros que chegam a outros livros. Considero que, quando um livro ou um texto meu consegue chegar a outros, então consegue algo.

Existe uma intertextualidade muito forte entre o seu livro e vários…

Sim, e de uma maneira muito vital. Este é um livro de muitos livros, de muitas referências, mas não é um livro que requer ter lido Dickinson ou profundamente os «Cantos de Pound» para ser entendido. As presenças são mais vitais do que académicas. Os leitores que têm uma bagagem intelectual ampla poderão encontrar muitas coisas no livro com as quais se conectam e entendem melhor; mas se não, pouco importa. Tem vários planos.

No princípio da entrevista disse que a realidade influencia a ficção e a ficção influencia a realidade. Quem constrói quem? É o autor que constrói as personagens ou as personagens que constroem o autor? Como é que é essa relação?

Completamente bilateral. Enquanto estou escrevendo um livro, também depois mas sobretudo enquanto estou preparando e escrevendo um livro, é evidente para mim a maneira como a ficção e as personagens desse livro modificam a minha experiência quotidiana.

São projecções suas?

Não, não… É de uma maneira muito concreta. Exemplifico com um par de pequenos exemplos:
No primeiro livro, «Papeles Falsos», eu estava escrevendo sobre Joseph Brodsky. Eu tenho nacionalidade italiana, mas não tenho residência, só nacionalidade. Soube no entanto de alguém que vivia em Veneza e que tinha umas cartas entre Brodsky e Pasternak. Então… tinha um amigo em Veneza que conhecia essa pessoa. Vou a Veneza, no Verão, para poder encontrar essa pessoa que tinha estas cartas. Era simplesmente interesse para o livro que eu estava escrevendo. Quando cheguei fiquei horrivelmente doente, quase morri, e tive que fazer uma série de «piruetas» para que me dessem a residência em Veneza. Tive que passar… tive um casamento [risos]… tive uma série de modificações brutais na minha vida. Havia ido perseguindo as cartas de Brodsky e terminei casada com um italiano [risos]… Um matrimónio muito efémero. Esta história incorporou-se no livro. Levou uma volta da ficção do livro à realidade e de volta ao livro.
Aqui neste livro também. Há um episódio que é meio ficção onde eu fui ao apartamento de Owen em Nova Iorque, onde vivia. Na realidade, fui a esse edifício, subi ao tecto e trouxe uma planta num vaso. Essa planta foi para casa de uns amigos que vivem em Princeton, perto de Nova Iorque. Bem… Eles divorciaram-se, mas essa mesma planta que está no livro, agora, foi depositada por uma amiga num cemitério, em Princeton, onde estão enterradas uma série de personagens. Ela mandou-me há pouco uma foto. Então… É como a ficção se incorpora na realidade. Na minha próxima novela também, apesar de já ter começado a escrevê-la. Sei disso porque aqui em Lisboa aconteceram uma série de experiências muito raras. Ontem, num alfarrabista, encontrei um livro do século XV que procurava há muito tempo. Fui a vários alfarrabistas até que finalmente encontrei. Eu sei que este livro vai ser chave para o meu próximo livro. De alguma maneira a ficção e a realidade estão sempre circulando…

Como tradutora vê algum paralelo entre a recriação, ou seja, na passagem de uma língua para outra, e a sua própria criação como autora?

Eu reflecti muito sobre a tradução. É um tema pelo qual sou obcecada e creio que na tradução há um processo de recriação. Uma boa tradução recria… A mim interessa-me muito que outras línguas modifiquem o meu espanhol. Cresci ouvindo muitas línguas porque passei por muitos países, cresci bilingue… Gostaria de pensar que as línguas estrangeiras ou os próprios exercícios de tradução dos livros modificaram-me…

É crítica literária…

Há uma diferença entre ser crítica literária e escrever sobre literatura, de vez em quando… Eu não me considero crítica literária, mas, de vez em quando, opino sobre os livros que leio.

Teve esse espírito crítico em relação ao seu próprio livro? Teve perspectiva avaliativa?

Sim… Eu sou dura e por isso demoro muito tempo a terminar. Eu corto, corto, corto… [risos] Sou dura comigo mesma e meticulosa. Quando era mais jovem, quando comecei a escrever crítica literária, era mais dura com as coisas de que não gostava. Agora não me interessa fazer uma crítica dura. Interessa-me escrever sobre os livros de que gosto. Não me interessa destruir um livro mau… Porquê? Para quê? Quando um livro me emociona procuro escrever sobre ele. Se algo é muito mau, o melhor é ignorá-lo.

Mário Rufino
mariorufino.textos@gmail.com









LINK: Texto de Maria Rosário Pedreira
publicado por oplanetalivro às 14:36

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